«Nota
Histórico-Artistica
No topo da
Serra de Arga, numa zona de rochas escarpadas e desfrutando de uma panorâmica
privilegiada sobre o curso final do rio Minho, a capela de São João é um dos
mais importantes testemunhos medievais da região, não obstante a sua pequenez e
simplicidade. Desde muito cedo foi sede de uma romaria dedicada a São João
Baptista, ainda hoje realizada pelos finais de Agosto de cada ano, momento
devocional que é apenas mais um a juntar às numerosas romarias locais que têm
como destino a Serra. Carlos Alberto Ferreira de Almeida caracterizou bem esta
situação, ao referir-se a uma "intensidade simbólico-religiosa"
local, materializada numa "antropologia religiosa dominada por uma
economia ganadeira" (ALMEIDA, 1987, p.154).
Desconhece-se a partir de que altura teve início esta concorrida romaria, assim
como desconhecida é a origem da capela. Uma tradição cronística da época
moderna, depois sucessivamente veiculada pelos Dicionários Corográficos dos séculos XIX e XX, sustenta que o
primitivo mosteiro havia sido fundado por São Frutuoso, ao redor de 623 (ALVES,
1982, pp.148-149, cit. Fr. Leão de São Tomás e Pe. Carvalho da Costa), ano
constante de uma discutida epígrafe de que, infelizmente, se perdeu o rasto. A
recente avaliação que Mário Barroca fez desta inscrição, concluiu pela sua
"existência duvidosa", a que não será alheia a "ânsia" de
Fr. Leão em remeter as fundações beneditinas portuguesas para tempos
remotos" (BARROCA, 2000, vol.2, t.1, p.162).
Por outro lado, este mesmo autor sugere que a inscrição, a ter existido,
poderia antes referir-se ao ano de 1123, proposta mais de acordo com os
prováveis caracteres que a compunham e relativa a uma época em que o mosteiro
já certamente existia. Com efeito, sabemos que um ano antes, em 1122, aparece
referido Sancto Johanne de
Arga, data que se adapta muito melhor ao que conhecemos acerca do
povoamento organizado da região.
Se é possível sugerir que o mosteiro existia já na primeira metade do século
XII, a actual capela dificilmente corresponderá a essa época. À semelhança do
vizinho templo de São Pedro de Varais, também a obra de São João de Arga
pertence àquele românico tardio, tendencialmente incaracterístico em termos
estilísticos, planimetricamente simples e decorativamente despojado. O que se
conserva da fábrica românica aponta para uma cronologia ao redor dos finais do
século XIII, época em que foi mais comum as pequenas igrejas rurais, de nave
única relativamente curta e capela-mor quadrangular, de panos murários muito
robustos e escassamente fenestrados e cachorrada de modilhões sem decoração. O
único portal original conservado confirma esta apreciação, com o seu duplo arco
já quebrado, assente em impostas lisas e de tímpano desprovido de elementos
artísticos.
A capela passou por algumas reformas ao longo dos séculos. De 1333 é uma
enigmática inscrição colocada na capela-mor (DGEMN on-line), provavelmente
alusiva a uma campanha de obras, quem sabe se a que lhe conferiu grande parte
da configuração actual. De maior impacto foi a campanha de finais do século
XVIII ou já de inícios da centúria seguinte. Nessa altura, por a parte
ocidental do edifício ameaçar ruína, ou por uma genuína vontade em actualizar e
monumentalizar a fachada principal, refez-se toda esta parte da igreja,
prolongando-se a nave e adaptando-se um frontispício com portal de arco recto
ladeado e sobrepujado por óculos (que conferem maior luminosidade ao interior)
e terminando em empena triangular irregular, acompanhada de volutas, pináculos
nos ângulos e uma cruz axial.
Em redor da igreja, e para albergar os numerosos romeiros que aqui se
deslocavam, construiu-se um albergue, edifício de dois corpos de planta em
"L" e de dois andares. Tendo em conta que a fachada principal datará
da viragem para o século XIX, é natural que também o albergue seja
contemporâneo dessa empreitada, respondendo eventualmente a um crescente
desenvolvimento da romaria e da festa em honra a São João.
PAF
Obs. Como se vê pelas imagens, o conjunto edificado encontra-se em obras de restauro.